- Publicidade -
spot_img
InícioArtigo de OpiniãoBois Brasil e Brasileiro

Bois Brasil e Brasileiro

*Por Roberto Jorge Sahium

Agora, tudo demudou bastante! A tal de “inteligência artificial (IA)” tá aí pra tudo que é de apuro. IA presente nas roças, nas cidades e lá nas grimpas do céu nem se fala, põe canga em tudo que aqui na terra bule e não bule.

Na roça a IA achegou com empreitada generativa e regenerativa há tempos, viera pelo carreiro da internet das coisas, trazendo balaios, tuias e paióis cheios até na tampa de técnicas para a povo roceiro dar aprumo a um montão de tarefas de roças. Tem-se Chatbolts abalizado no ChatGPT para coleta de dados do clima, controle de pragas e doenças, assistência técnica e extensão rural com lonjura ou perto, entre muitas outras.  

Ante tantas tecnologias IA hoje para o campo, o algoritmo de outrora empurrou os neurônios, lembrei de uma junta de bois, Brasil e Brasileiro ajustada pelo meu Vô Gaspar. Nesse tempo o grosso dos serviços de roças eram tocados a tração animal. Os roceirinhos lerdinhos e preguiçosos carregavam água e comida para os trabalhadores. Os meninos espertos eram candeeiros, puxadores de juntas de bois, ora nas arações, ora nos carros-de-bois. Agora vejo que os meninos espertos são os que não puxavam bois.

Brasil e Brasileiros eram bois dobrados e quase parelha, mascarados, curraleiros do meio, castrados, massudos, pesavam em torno de 250 quilos cada bicho, pareciam dois astros de tv. Caros, assim dizia o Velho Gaspar. 30 bois desses comprava um fusca zero, que na época custava Cr$ 471.200.

Neste andamento estava eu entrando na idade de moleque de usar calça comprida e sapato Vulcabras.

Outra coisa, Seu Gaspar corria léguas de boi chifrudo, grande e pesado, porque dava muito trabalho no serviço de aração, embaraça na manobra de pegar a outra linha, questão que o fez adquirir os animais de cabeceira do Zé Boiadeiro que morava lá pras bandas da Serra Feia, acolá na comarca do município de Varjão.

Boiadeiro tinha como sina a proficiência da arte de castrar, mochar e amansar bezerrotes. Cunhava bois para dupla aptidão: animal de cabeçalhos e de guias de carro de boi e também animais para serviços de tração de carpideira, arado de aiveca e rolo faca, equipamentos que eram muito usados para limpar terrenos sarobados, rasgar capoeiras menores e lavrar chão duro e mole.

Ô vida cruel era aquela! Baixa produção, e tinha que grudar feio no serviço para ter ganho.

Lembro também de uma roça de milho firmada em duas quartas de terreno, terra boa, culturão de mata de Peroba Rosa, chão de meia encosta destocado há um bom tempo, onde a aração precisava de cortar umas moitas de capim Jaraguá e arbustos de Lobeiras.

Chegamos lá com os bois ainda no turvo do dia e aquela chuvinha de molhar bobo sobre nossos lombos, era água que vinha do céu para amaciar o solo. Brasil e Brasileiro encangados, cabeçalho preso na corrente, a pareia assumiu sua função na testa. No primeiro arranque quebra a canga. Nova canga de garapa nos cangotes foi acertada. Tudo pronto, com meu avô agarrado na rabiça do arado-de-aiveca e eu na frente candeando os bois. Daí descobrimos que o Brasileiro se esforçava, porém o Brasil não queria nada com a dureza e nisso começa os gritos de comando.

Hô Brasil, hô Brasil, hô Brasiiiil! Tudo que tinha de psicologia para bovinos foi usada e o Brasil não aluía os cascos e, vez por outra, queria me acertar com a cabeça. Mas lá pras tantas, o sol mostrando a cara de halo solar, nuvens altas e fibrosas evidenciando alta umidade no ar, mais chuvas nos adjuntos estavam prometidas. Nisso, Brasil puxado pelo Brasileiro também rompeu e enleirou os passos do Brasil.

Gastamos três dias de seis horas cada dia para deixar as duas quartas de chão com o primeiro ferro de aiveca e pronto para receber o corretivo. Velho Gaspar usava jogar cal Virgem (CaO) no solo, e dizia ele, que a CaO Virgem era para tirar o azedume da terra e aplicado antes de passagem do 2º ferro, do mesmo modo usado para quebrar os torrões para deitar as sementes de milho.

Nas duas quartas de terra goiana (24.000 m2) produziu na ocasião o suficiente para encherem cinco carros de espiga de milhos, peso de aproximadamente 28.000 quartas (7.000 Kg), quantidade para encher nosso paiol. Colhemos também umas 100 arrobas de abóboras comuns maduras, para adoçar a carne da porcada, produzidas de pareia com o milho. Um carro de boi abarrotado até as alturas dos fueiros carrega 50 balaios de aproximadamente 28 kg cada balaio ou 1.400 kg de milho seco com palha e tudo.

Contudo tenho boas lembranças desta época. No entanto, moer café às quatro horas da manhã, buscar palha seca de milho no paiol para atiçar o fogo de manhã no fogão caipira e lavar chiqueiro nos meses de maio e junho não tenho um pingo de saudade.

E para pôr fim nesta prosa, comparando o que não tem nada a comparar, acolá pras bandas da Praça dos Três Poderes, diga-se Vaticano das Santidades que passam o tempo todo orando e enclausurados, vida imposta pelas hóstias recebidas do Pontífice Maior, lá o Brasil é que que põe canga nos Brasileiros para não acenderem Ordem e Progresso, pois a IA por ali ainda se encontra na Pedra Lascadas ou Era dos Flintstones. Quanto a nóis roceiros que faz uso das tecnologias, drones, insumos naturais, para abastecer de alimentos, águas, biocombustíveis e fibras e, ainda de gorja liquidar o carbono e o metano emitidos pelos brasileiros e estrangeiros, estamos todos faceiros.

Quanto aos nomes dos bois Brasil e Brasileiro correu por conta da patriotada do Mestre Zé, sorte dele, pois se fosse hoje este patriota estaria em más pastagens e andando de peia eletrônica. E no mais não adianta querer mudar o nome de boi, eles não atendem.

*Roberto Jorge Sahium é Engenheiro Agrônomo, extensionista raiz e Imortal da Academia de Letras da Extensão Rural Brasileira, e da Academia Tocantinense do Agronegócio, encontra-se projetista agroambiental autônomo.  

- Publicidade -spot_img
Não perca
Notícias relacionadas

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui